“Estou desistindo de jogar pela quantidade de pessoas tóxicas que caem no meu time ou no adversário. Muitas vezes tenho que criar uma nova conta, com o nick unissex, para evitar o abuso e assédio dentro dos jogos. Jogo com o chat desativado, pois os comentários são muito ofensivos e abusivos. Entrei neste grupo achando que era só de mulheres, mas me deparei com mais posts de homens, muitas vezes preconceituosos e ofensivos.”

Infelizmente, estes e outros relatos parecidos são comuns entre mulheres que fazem parte do ambiente gamer – um universo ainda muito masculino e carregado de machismo. E essa foi justamente a motivação de Daniela Biedzicki, conhecida nas redes sociais e no universo gamer como Bacone, a criar o projeto Troco Like Por Respeito. “Nosso foco é atingir o maior número de mulheres, independente da idade, para que assim, possamos formar uma comunidade amigável e esportiva, livre de pessoas tóxicas que costumamos ver, principalmente, dentro dos jogos online. Existem grupos no WhatsApp, Facebook e Discord, todos formados e administrados por mulheres”, explica. O grupo no Facebook conta hoje com mais de 140 participantes. 

Para Daniela, o ambiente gamer como um todo ainda é um cenário muito machista e para fazer parte dele, é preciso lutar contra alguns preconceitos. “Para as mulheres, muitas vezes pode ser um cenário ainda mais tóxico, devido a quantidade de assédio encontrando não só dentro dos jogos online, como através das streams de jogos feitas por plataformas como Facebook, Youtube e Twitch”, conta Daniela. Segundo ela, no cenário de competitivo de e-sports, ainda se vê um ambiente predominantemente masculino, mas que aos poucos está abrindo margem para algumas mulheres ingressarem e fazerem parte deste universo -mas que ainda é bastante precoce.

“A imagem da mulher que joga, muitas vezes, também acaba sendo distorcida até mesmo com padrões estéticos aplicados por pessoas que, claramente, não fazem correlação nenhuma ao fato da mulher simplesmente exercer uma atividade livre, como jogar. Não há padrões a serem seguidos, nem horas mínimas de jogo que você tem que ter para ser uma ‘mulher gamer’. Basta ser mulher e jogar. Nem mais, nem menos”, ressalta. 

Lidando com o preconceito desde cedo

Daniela conta que, desde muito nova, teve contato com videogames, fossem eles do irmão ou dos primos. Conforme eles iam crescendo, ela “herdava” seus consoles e cada vez mais gostava de jogar jogos diferentes. “Dentro da família, nunca tive empecilhos ou preconceitos relacionados ao fato de ser uma mulher e gostar de jogar, inclusive meus pais sempre me apoiaram, comprando fitas”, relata. 

E segundo ela, desde a sua época de ensino médio, já teve de lidar com uma espécie de bullying pelo fato de ser uma adolescente, mulher, que gostava de videogames. Entre as situações de preconceito que já enfrentou durante os jogos, considera que as piores ainda sejam relacionadas a falta de educação e de respeito, atreladas ao simples fato de ela ser mulher. “Dentro dos jogos online, já ouvi termos dos quais até me envergonho de repetir, mas que são muito presentes diariamente na realidade da maioria das mulheres. Até mesmo algumas frases clichês como ‘lugar de mulher é na cozinha’ ou ‘vai lavar uma louça’ – esses são os mais leves”, conta.

De acordo com a gamer, xingamentos inclusive com conotações sexuais, são absurdamente comuns dentro desses jogos. “Felizmente, muitas plataformas tanto de jogos, quanto de streaming, possuem suporte para denúncias relacionadas a abuso verbal/homofobia/discurso de ódio/bullying. Por mais que às vezes as pessoas hesitem em denunciar, eu sempre apoio e digo que precisamos fazer a denúncia sim”, declara Daniela. 

União é o caminho

Apesar das dificuldades, Daniela ressalta que o mundo dos jogos está em constante evolução e que há espaço para todas. “Idealmente, nem todas precisam passar pelas coisas das quais citei aqui, e pra isso existem movimentos como o #TrocoLikePorRespeito. Não tenham medo, não tenham vergonha. Gostar de jogar é um hobby. Independente da idade, crença ou orientação sexual. Todas as mulheres deveriam se sentir representadas no mundo dos jogos, pois é algo incrível você poder exercer algo com o qual você tem afeição”, incentiva. “Os jogos proporcionam experiências incríveis, que todas as pessoas que gostam deveriam ter a chance e o espaço para participar. Nós devemos nos unir e clamar por um espaço que também é nosso. Destruir esses preconceitos, definir novos ideais e sermos livres para sermos quem nós somos”, complementa.

As meninas gamers são muito bem-vindas para conhecer o Gamer Girlz BR no Facebook. Conforme explica Daniela, o grupo é privado e tem como diferencial ser composto e administrado apenas por mulheres. “Nele, temos os nossos grupos do WhatsApp e Discord para quem quiser participar e inclusive é um lugar aberto para divulgação de conteúdos e lives. Sempre tentamos promover um ambiente saudável para todas as mulheres, incentivando a postarem suas páginas, lives e qualquer conteúdo relacionado a jogos que possa interessar”, finaliza.

*Correiodopovo