Em uma decisão pioneira, que coloca em xeque o comportamento predatório do Google em relação a temas como propriedade intelectual e concorrência, a França intimou a empresa do Vale do Silício a negociar “de boa fé” com jornais e agências de notícias do país uma taxa pelo uso de seus conteúdos. 

A decisão da Autoridade de Concorrência, órgão regulador francês, tem como base um mecanismo europeu que visa garantir o pagamento de conteúdo digital mostrado pelo Google e que tem origem em veículos profissionais de imprensa. A entidade impôs um período de três meses para que o Google estabeleça negociações com publishers que estiverem abertos à negociação. O diálogo, segundo o órgão, deve culminar em uma proposta de remuneração por parte da empresa americana a jornais, revistas e outros veículos de comunicação proprietários dos direitos de uso dos conteúdos, como textos. 

A negociação deve incluir eventual cobrança pelo período de uso dos conteúdos desde a entrada em vigor da diretiva, em 24 de outubro de 2019. Na decisão, a Autoridade de Concorrência francesa definiu as práticas do Google como “abuso de posição dominante” e considerou que a estratégia da companhia americana pode causar “sério e imediato prejuízo ao setor de imprensa”.

A diretiva foi criada pela União Europeia e vale para todos os 27 países do bloco. A França saiu na frente na implementação. A regra diz respeito aos chamados “direitos relacionados”, uma disposição semelhante aos direitos autorais, em benefício da imprensa escrita. O objetivo é que jornais e agências de notícias negociem uma remuneração com os gigantes digitais, como Google e Facebook, que recebem a maior parte da receita de publicidade na internet pela reutilização de seus conteúdos. O Google, que exerce monopólio como mecanismo de busca, tem rejeitado qualquer negociação. Pela visão da empresa americana, os sites de notícias têm de concordar que o buscador use gratuitamente trechos de seus textos em seus resultados de busca. Caso contrário, as informações são menos visíveis, o que, inevitavelmente, faz com que o tráfego de usuários caia em suas páginas – e, consequentemente, sua receita publicitária.

A European Newspaper Publishers Association (ENPA), entidade que representa as editoras jornalísticas da Europa, comemorou a decisão francesa. 

– Os publishers europeus se uniram durante a negociação da diretiva e permanecem unidos durante sua implementação. A decisão (francesa) marca um primeiro passo histórico, no qual a França entende a necessidade de proteger a imprensa diante do comportamento do Google, que claramente decorre de um abuso de posição dominante. Atualmente, estamos experimentando o quão importante é a diferença entre notícias falsas e o jornalismo profissional – afirmou o presidente da ENPA, Carlo Perrone, referindo-se ao papel exercito pela imprensa na crise do coronavírus.

*Gauchazh